Semana passada eu tive uma experiencia diferente. Ha cerca de oito meses eu decidi que partiria para a busca dentro de um programa de Residencia em Odontologia aqui nos EUA. Uma decisao feita depois de testemunhar o sucesso do meu irmao na sua aprovacao na prova do INBDE e a minha longa historia de “desejo de passar na prova”. Eu sempre disse que este desejo morava dentro de mim, mas mais para uma conquista pessoal, dizendo que como Dentista nos EUA, eu tambem tinha conseguido vencer esta barreira. O plano sempre foi passar na prova e continuar tocando a vida.

Viver e trabalhar nos Estados Unidos em absolutamente nada garante uma boa nota na prova do TOEFL. Pode parecer besteira, mas acredite em quem já fez esta prova duas vezes, está prestes a fazer uma terceira vez e toda vez que estuda para a execução da prova o sentimento de incerteza sempre reaparece. Eu tenho visto gente que também não teve o inglês como língua nativa dizendo que obteve notas acima de 110 (a nota máxima é 120). Para mim, realmente isso parece impossível, mas o que eu estou começando a pensar é que a execução desta prova necessita mais treinamento do que conhecimento.

Até seis meses atrás eu tinha a convicção de que a minha vida pouco ou nada mudaria e eu tinha certeza de que pouco ou nada mudaria pelo menos nos próximos seis anos. A notícia da aprovação do meu irmão na prova do INBDE recebida naquela tarde de setembro de dois mil e vinte um foi a fagulha necessária para reacender um desejo apagado há mais dez anos; desejo este advindo de uma vontade que sempre existiu (viver e trabalhar nos Estados Unidos), mas a qual eu não tinha a menor idéia de como proceder para poder chegar lá.

Tudo começou como que um empurrão. A frase “Vai e não olhe para trás.”, vindo de quem veio, foi o que faltava para aquela decisão que definiria o meu futuro. Os termos “Advanced Standing Program”, “National Board Dental Examiners” e “intent letter” eram coisas completamente desconhecidas até então. Na verdade, até aquele momento a minha possibilidade de trabalho nos Estados Unidos como Dentista era uma coisa totalmente obscura. Era uma coisa impossível. Quatorze anos depois, estamos aqui vivos e fortes certos de que até aqui Deus tem nos ajudado. E assim pretendemos continuar.

O ano de 2013 seria um ano decisivo para mim na questão de trabalho. Este seria o quinto ano da minha licença limitada em Odontologia no Estado de Massachusetts. Depois desta data eu deveria buscar um programa de revalidação do Diploma – o chamado Advanced Standing Program – em qualquer Universidade que oferecesse o programa ou eu deveria ser aprovado em prova prática nas áreas de Dentística, Periodontia, Endodontia e Prótese.

A coisa mais fácil de ser encontrada na nossa vida são barreiras. Sejam físicas ou não, a gente sempre vai encontrar momentos, dias e pessoas que te fazem pensar duas, três, quatro vezes antes de decidir continuar a progredir. Quem me conhece bem sabe da minha história, no primeiro ano da Faculdade um certo professor de Materiais Dentários me disse que era impossível me tornar um Dentista nos Estados Unidos e que isto nunca iria acontecer. Quase doze anos depois, lá estava eu sendo contratado como Dentista em um Centro de Saúde Comunitário no Estado de Massachusetts, trabalhando período integral como... Dentista!

E aqui estamos novamente. Eu não sei se muita gente sentiu falta das nossas postagens aqui no blog, mas eu senti. Se você se perguntar o motivo por que eu me afastei do blog Dentista Brasileiro nos EUA, quero usar este espaço agora para contar um pouco dos motivos.

Voltamos. Sei que já faz um bom tempo. Eu não deixei o blog de lado, mas comecei a trabalhar na preparação para a prova do Integrated National Board Dental Examiners. Confesso não estar nada fácil voltar a estudar, ainda que a necessidade de se memorizar rodapés de livros por conta de matérias de ciências básicas não serem mais um problema, ainda assim as correlações entre as informações destas mesmas matérias básicas com as atividades clínicas diárias vêm demandando muito tempo e concentração.

Nossos primeiros pacientes são personagens memoráveis na nossa vida. Se seus nomes nos fogem da memória, a fisionomia e o que a gente sentiu no momento que passamos com eles, acabam ficando marcados para sempre na nossa cabeça. Tomo como exemplo a minha primeira paciente na faculdade. O ano foi noventa e cinco, aula de Odontologia Preventiva e eu tive que fazer profilaxia e aplicação de flúor. Nem vou comentar sobre a mau jeito e falta de posicionamento para este procedimento, mas a emoção maior foi a sujeira que eu acabei fazendo com o evidenciador de placa bacteriana. Uma coisa que eu descobri? A sobrancelha da menina tinha placa porque ficou super evidenciada.

O filosófo e professor Mario Sergio Cortela tem por hábito descrever a etimologia das palavras e termos que ele utiliza. Particularmente eu gosto muito de ouvi-lo falar, porque ele traz à tona idéias e ensinamentos que, por mais que sejam óbvios, nem sempre a gente para para pensar. Na questão etimológica eu gosto de entender de onde os termos se originam e - por ter o Português como primeiro idioma - acaba ficando mais fácil compreender principalmente as palavras de origem latina. Um exemplo é a palavra “doméstico”. Domus vem do latim “residência”, então “doméstico” é qualquer coisa relacionada com a sua residência, o prédio ou a casa. Outras palavras de origem grega também fazem parte da raiz de muitas palavras. “Aracnofobia” é um grande exemplo: “aracno” para aranha e “fobia” para medo. Simples como um mais um igual a dois.

Acho que todo mundo que acompanha este blog sabe das lutas e dificuldades pelas quais um Dentista no Brasil passa. Seja antes mesmo do inicio das atividades profissionais, ainda na Faculdade, com provas e situações nunca antes conhecidas, problemas financeiros para o pagamento das mensalidades ou mesmo pacientes que causam discomforto durante os procedimentos, ninguém se sente preparado para o que pode acontecer durante a nossa vida profissional.

Eu tenho um amigo que recentemente se aposentou como Coronel do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo. Quando o conheci ele tinha terminado a Academia há pouco tempo e se não me falha a memória ele estava no meio do curso de formação de Bombeiro – mais ou menos como uma pós-graduação para quem se gradua na Academia Militar do Barro Branco em São Paulo. A sua paixão pela corporação sempre caminhou com ele, ao ponto de ele ter ficado bastante abalado quando, conforme ia crescendo dentro da corporação, mais e mais ele desenvolvia trabalhos burocráticos ao invés de estar na linha de frente em ocorrências e chamadas.

Minha faculdade formou grandes nomes dentro da Odontologia. Muitos ganharam o mundo e hoje desenvolvem sua atividade em países como Portugal, Suíça, Espanha, Irlanda e por aqui mesmo nos Estados Unidos. Nunca houve dúvida nenhuma de que o ensino oferecido dentro dos anos acadêmicos na nossa instituição provou ser de alta qualidade, ainda que não carregasse a tradição de instituições financiadas pelo governo.

Em 2014 nosso Community Health Center tornou-se um local para treinamento de Residentes da antiga instituição Lutheran Medical Center, um centro espalhado por todo o país que oferecia programa de Advanced Education in General Dentistry (AEGD) para Dentistas recém formados em Universidades Americanas e estrangeiros que desejavam buscar aprofundamento em solo americano e, quem sabe, buscar o exercício da Odontologia em Estados Americanos que aceitassem um ano ou dois anos de programa reconhecido pelo Commission of Dental Accrediation – CODA. Naquele nosso primeiro ano, tivemos um Residente recém-formado pela Tufts School of Dental Medicine que após o término da sua residência no AEGD, emendou um segundo programa de Residência em Odontopediatria aqui próximo de onde estamos em Providence, Rhode Island, e hoje ele trabalha como Odondopediatra em Tampa, Florida.

Imagine seu início de carreira logo depois de terminar a faculdade, no nosso caso, de Odontologia. Alguns de nós com promessa de trabalho, outros em conversação com chefes de departamento para engatar um mestrado, hoje em dia gente já pronta para iniciar especialização e alguns poucos herdando – ou iniciando – o trabalho com os pais ou parentes mais próximos. No meu caso, eu não acho que tenha sido nenhuma das alternativas.

O sonho Americano vive na imaginação de muitas pessoas pelo mundo. Mas o que é o sonho Americano? É difícil definir em uma frase o que se deseja como sucesso pessoal. O sonho Americano para um pode ser completamente diferente para outra pessoa. Vale também dizer que o sonho Americano tem muito mais valor e apreço para quem vem de fora dos Estados Unidos, porque para quem nasceu e viveu ali é somente um sonho.

Com o passar do tempo a gente acaba se acomodando com determinadas coisas que acontecem ao nosso redor. Você vê o caso de quem mora em locais onde a taxa de crime é grande. O relato de assaltos, tiros e homicídios muitas vezes passa desapercebido e o assunto muitas vezes acaba sendo somente mais um tópico de conversas aleatórias. Aqui nos Estados Unidos a mesma coisa acontece, mas não necessariamente falando sobre violência.

Mais uma temporada do verão que está chegando por aqui e as coisas parecem ter se normalizado. Pelo menos por enquanto a necessidade do uso constante de máscaras está colocada de lado e as pessoas começam a se sentir um pouco mais confortáveis em suas interações sociais. Dentro do consultório, pouco ou quase nada mudou a não ser a não necessidade de se aguardar 15 minutos para a limpeza das salas entre um paciente e outro. Hoje, com cinco minutos somente já é possível iniciar a higienização das salas e preparo para o próximo paciente.

Já faz mais de vinte anos que eu iniciei a minha vida dentro da Odontologia. O meu início não deve ter sido tão diferente de tantos outros que, como eu, achavam que para trabalhar como Dentista, o sucesso viria simplesmente através da sua permanência dentro de um consultório recém montado e os pacientes viriam até você como em um passe de mágica. Hoje eu espero que os novos Dentistas que ingressam no mercado de trabalho tenham uma visão um pouco mais realista desta dinâmica de trabalho. Vale dizer que, assim como eu, muitos que iniciaram suas vidas profissionais esperando os pacientes caírem do céu devem estar ainda olhando para cima.

Recentemente eu recebi uma mensagem de uma leitora do blog e que venho procurando ajudar há algum tempo. Geralmente eu não procuro me ater muito à informações pessoais para que eu não dê a idéia de intromissão, mas ela já está morando nos EUA há algum tempo e pelo que constatei, seu visto de residência permanente está para ser emitido.